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O bebê reborn chorou nessa noite
O bebê reborn chorou nessa noite*
Não há bebê, é o que disse esse choro do silêncio. Não há nada. Pepe Mujica nos deixou, o amor que ele nos ensinou pela democracia coloca ela própria (e todos nós?) em risco. Assim, de madrugada, parecem acordar alguns pensamentos procurando pela porta de saída, pedindo elaborações. Que enorme solidão é essa do mundo que uma moda como essa pode surgir, crescer e contaminar nossa mente sem que sequer busquemos? Como pode um objeto, nesse caso caro e, para alguns, totalmente ridículo por seus vazios de sentido emborrachados ou de silicone, ter vida? E não uma vida qualquer, a vida preciosa de, talvez essa seja a condição em alguns casos, alguém que deveria existir e ocupar um espaço real mas que já se foi ou ainda não chegou. Perda materna, que dor. Solidão extrema, lutos por projetos falidos, por nós mesmos que vamos deixando os pedaços de si por aí afora...tantos buracos que um objeto pode simplesmente preencher.
Não acredito ser tão reta essa conversa, primeiro porque de objetos animados podemos fazer disparador para pensar: adaptados ao capitalismo, no caso deles serem atribuídos de valor pela moda, a tendência justifica. Mas não podemos esquecer da colonização que teve como centro a concepção de atraso quando a natureza é viva e fala conosco. A tia montanha e ancestral cachoeira, por exemplo, foi e segue sendo desautorizada. Nosso direito de brincar foi arrancado há séculos, não é um resgate fácil. Sobretudo porque nos ensinaram que os jogos são finitos**, que estamos sempre no banco de reservas, que assistimos como quem espera o fim da prorrogação de um jogo já perdido. Não temos torcida, nosso time está brigando entre si, não é possível imaginar uma virada. Mas para seguir produzindo nesse sistema dentro da conjuntura contemporânea não podemos morrer de solidão eterna nessa espera, nosso sofrimento só é aceito até o ponto em que estiver rendendo gols. Nessa mesma madrugada pensei no silêncio do meu apartamento e no espaço enorme que me rodeia, me angustiei com a ideia de que falta alguma coisa. Eu sei que essa conversa ainda vai muito longe e tem muitas curvas. Para tanto as decisões de qual esquina dobrar para se encontrar ou encontrar algum sentido em algo/alguém/algum objeto nunca silenciam enquanto seguimos nossas buscas, talvez, esteja representada na minha difícil decisão que apenas representa outras: se adoto logo as gatinhas Milk e Shake antes de enlouquecer e amadrinhar um bebê reborn? Mas para onde eu iria com elas depois daqui? Ou será que não vou? Tantas coisas podem acontecer quando estamos na perspectiva "e se?" possibilitando hipóteses, fabulando nossas vidas e destinos como uma cartomancia pessoal em busca de reconhecer, compreender (talvez até realizar?) nossos desejos, nossos motores para seguir nas estradas escolhidas e aprender sobre nós pela imaginação das estradas não escolhidas, nossas faltas também podem ter muito a nos dizer.
Autora: Eliane Silva Gonçalves, em 14/05/2025
*Escrita auto(hetero)biográfica.
**Relação com jogos infinitos e perspectiva Jossoniana de vida e narrativa na ação e não na prorrogação.
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