A cidade como galeria: estudantes ocupam as ruas com arte que escapa dos museus e toca o cotidiano
Juventudes do Bioma Pampa se mobilizam rumo à COP30
As transformações climáticas já moldam a vida cotidiana de milhares de pessoas no sul do Brasil, com enchentes recorrentes, ventos extremos e insegurança sobre o futuro. Em meio a esse cenário de urgência ambiental, duas vozes jovens se erguem como representantes do Bioma Pampa na próxima Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP30, que ocorrerá em novembro de 2025, em Belém (PA).
No programa Contraponto, da RádioCom Pelotas, Paula Hann e Victor Samala compartilharam suas trajetórias até a eleição como representantes do Bioma Pampa e discutiram o papel essencial das juventudes frente à emergência climática. Com experiências distintas, mas complementares, ambos vão representar um território historicamente negligenciado nos grandes fóruns ambientais.
Viver o Pampa: a crise climática no cotidiano
Para Paula e Victor, a emergência climática não é um conceito abstrato — é uma realidade sentida na pele. Paula, estudante de Relações Internacionais na UFPel, descreveu as frequentes enchentes que assolam Pelotas. "Se chove por meia hora, já alaga. Árvores caem, janelas batem, é uma situação de medo constante", relatou. Ela questiona a naturalização dessas ocorrências e defende que o problema é tratado com descaso tanto por entes públicos quanto privados.
Victor, jovem articulador comunitário e estudante do ensino médio, reforçou essa percepção ao destacar a sensação de impotência da juventude frente aos desastres naturais. "A gente vê o que está acontecendo, mas não sabe por quê. Só dizem que é aquecimento global, mas ninguém explica o que isso realmente significa para nós", desabafou. Para ele, é essencial tornar o debate mais acessível às novas gerações.
Ambos apontam que o território do Bioma Pampa, embora presente em suas rotinas, é pouco conhecido e valorizado — inclusive entre os próprios jovens. A missão deles, portanto, inclui traduzir essa vivência em linguagem política e apresentar ao mundo a complexidade da realidade sul-brasileira.
Escolher representar: da formação crítica à responsabilidade coletiva
A decisão de se candidatar como representantes do Bioma Pampa na COP30 foi movida por percursos distintos, mas igualmente potentes. Paula atribui sua motivação à formação política e crítica proporcionada pela universidade. "Na UFPel, aprendemos que o local é global e o global é local", afirmou. Ela ressaltou o impacto que teve ao ouvir as falas de jovens quilombolas, pescadores, pomeranos e outros grupos durante a plenária estadual.
Já Victor contou que chegou ao evento por indicação da família e com baixa expectativa. No entanto, ao perceber que era o mais jovem entre os participantes e notar a ausência de vozes parecidas com a sua, sentiu-se impulsionado a ocupar aquele espaço. "Ninguém da minha escola sabia o que era o Pampa. Eu também não sabia direito, mas fui aprendendo ali", relatou. Sua motivação cresceu a partir da ideia de que sua presença poderia abrir caminhos para outras crianças negras e periféricas.
Ambos destacam que a representatividade não é apenas ocupar um lugar, mas honrar as vivências e lutas coletivas de suas comunidades. A presença deles na COP30 será resultado de uma trajetória que mistura curiosidade, indignação e desejo de transformação.
As plenárias e o nascimento de um documento coletivo
Durante dois dias de debates em Pelotas, os jovens participaram ativamente das plenárias do Bioma Pampa, evento que reuniu representantes de diversas comunidades tradicionais. No primeiro dia, o foco foi compreender o funcionamento da COP e contextualizar o Bioma Pampa no cenário ambiental global. No segundo, os participantes se dividiram em grupos para produzir um documento político, que será levado à conferência.
Entre os temas debatidos, destacaram-se a segurança humana — entendida como um conceito que inclui segurança alimentar, habitacional, física e emocional — e a necessidade de políticas públicas que reconheçam os direitos e saberes dos povos tradicionais. Segundo Paula, "a crise climática não é só geofísica, ela é emocional, cultural e social".
Victor lembrou com intensidade das denúncias feitas por povos pomeranos durante a plenária. "Eles falaram que foram atacados e nem considerados humanos. Isso me marcou. Se isso acontece com eles, o que será da juventude desses povos?", questionou. Para ele, o espaço da plenária expôs feridas abertas e urgências acumuladas, que precisam ser levadas com seriedade à COP30.
O que esperam da COP30: escutar, aprender e construir caminhos
Apesar das expectativas moderadas quanto ao protagonismo na conferência, Paula e Victor enxergam a participação na COP30 como um passo fundamental em suas trajetórias. Paula acredita que, embora não tenha voz direta nas decisões, poderá fortalecer o trabalho coletivo por meio do diálogo e da articulação. “Esses espaços são historicamente dominados por grandes líderes, mas vêm se abrindo à sociedade civil”, pontuou.
Victor quer ouvir e aprender. "Eu só quero escutar, aprender. Se tiver uma chance, tentar fazer alguma coisa", afirmou. Para ambos, a COP30 é mais que um evento: é uma possibilidade concreta de ampliar repertórios, fortalecer redes e preparar o terreno para uma atuação política de longo prazo.
A presença de Paula e Victor em Belém será, sobretudo, uma mensagem: o Bioma Pampa tem juventude, tem voz, e está pronto para construir soluções frente à crise climática global.
*Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.
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