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Edição da Manhã: juventude rejeita CLT como reflexo da precarização pós-reforma trabalhista
Cada vez mais presente nas redes sociais, a crítica de jovens à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) revela muito mais do que uma simples rejeição ao emprego com carteira assinada. Na avaliação da economista Lucia Garcia, do Dieese, o que se vê é uma denúncia contundente da degradação das condições de trabalho após as reformas implementadas nos últimos anos. A geração Z, afirma ela, está se deparando com um mercado em que o trabalho formal já não garante segurança nem dignidade.
Segundo Garcia, a leitura crítica feita pelos jovens reflete um cenário onde o sistema de proteção social foi desestruturado. “Não é uma crítica ao trabalho protegido, é uma denúncia do grau de desproteção do trabalho hoje”, afirma. Ela destaca que as reformas trabalhista, previdenciária e a ampliação da terceirização criaram um novo contexto de inserção laboral, marcado por incertezas e flexibilizações abusivas.
Essa insatisfação, afirma a economista, tem sido erroneamente interpretada como um desprezo pelo trabalho em si. “Estamos entregando na mão da direita essa denúncia, como se o emprego fosse algo degradante. O que é degradante são as condições atuais”, ressalta.
Flexibilidade ou sobrevivência?
A romantização do empreendedorismo e da informalidade também foi abordada por Lucia Garcia. Para ela, a ideia de que trabalhadores das periferias desejam ser empreendedores é, muitas vezes, uma projeção da classe média. “Esse glamour está sendo dado por nós. O trabalhador está dizendo: ‘aqui é onde eu consigo me virar melhor’”, explica.
Garcia relata que muitos trabalhadores optam pela informalidade por necessidade de conciliar múltiplas tarefas, como cuidar dos filhos e gerenciar a vida doméstica. Com a fragilidade da proteção oferecida pela CLT, a escolha entre trabalhar 45 horas semanais com direitos parciais ou ter autonomia mesmo sem garantias torna-se uma questão de sobrevivência. “Quando o guarda-chuva da proteção social é furado, você tem que ter jogo de cintura para viver.”
Mesmo em condições precárias, há um esforço dos trabalhadores em manter alguma rede de segurança. Segundo dados mencionados por Garcia, quase 30% dos assalariados sem carteira assinada no setor privado do Rio Grande do Sul contribuem para a previdência de forma autônoma. “Isso mostra que eles não desprezam a proteção social. Apenas não a encontram mais dentro da CLT.”
A revolução silenciosa da geração Z
A resistência da geração Z aos postos de trabalho formais também se manifesta de maneira prática: muitos simplesmente recusam ofertas que consideram injustas. Garcia cita o caso de supermercados da Região Metropolitana de Porto Alegre, que enfrentam dificuldades para contratar. “Eles estão oferecendo bônus para quem indicar amigos, mas não conseguem trabalhadores”, relata.
Essa postura, para a economista, representa uma nova consciência de classe. “É uma revolução silenciosa. A geração Z cruza os braços diante da oferta de trabalho ruim”, afirma. Para ela, o comportamento dessa juventude exige uma reflexão mais profunda dos setores progressistas e sindicais, que muitas vezes estão focados em dominar ferramentas de comunicação, mas não atualizam o conteúdo de suas pautas.
“Se o trabalhador entende que aquele dispositivo da regulação do trabalho é central na sua vida, aí sim temos consciência de classe. E isso está acontecendo”, destaca.
Caminhos para reconstruir a proteção
Uma das saídas apontadas por Lucia Garcia é a redução da jornada de trabalho. Com a reforma trabalhista, houve um crescimento das jornadas extensas, muitas vezes sem o devido pagamento ou compensação. A economista propõe a retomada de uma legislação que assegure não só jornadas menores, como também pausas adequadas e proteção nos fins de semana.
Garcia também defende uma contrarreforma trabalhista, inspirada na experiência recente da Espanha. “Eles revisaram as modalidades contratuais, recompuseram a hierarquia entre o legislado e o negociado, e restauraram a validade dos acordos coletivos”, explica. No Brasil, medidas semelhantes poderiam enfrentar a fragmentação do mercado de trabalho e recuperar a efetividade da CLT.
No entanto, ela reconhece que isso só será possível com pressão popular. “Com o Congresso atual, não vamos passar nada. Mas temos que mostrar que tentamos, e que o problema está no Congresso. Precisamos demonstrar isso à sociedade.”
Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.
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