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Cadência argentina no nativismo Percussionista Carlos Perez relembra trajetória e anuncia novos projetos (por Daniel Silveira)

Cadência argentina no nativismo Percussionista Carlos Perez relembra trajetória e anuncia novos projetos (por Daniel Silveira)

Reconhecido percussionista do meio nativista gaúcho, o músico argentino Carlos Alberto Perez conclui na sexta-feira, 12/08, sua passagem por Pelotas para um intercâmbio de “sonoridades percussivas”. Assim ele definiu a sua estada de três dias com o baterista e percussionista Matt Thofehrn na cidade da Zona Sul do Estado.

Destaque na percussão da música gaúcha durante os anos 80, quando foi considerado um dos melhores percussionistas da região Sul, Perez notabilizou-se por trazer novos elementos rítmicos, sonoros e performáticos ao nativismo.  Com ousadia e inventividade, o artista desenvolveu uma nova linguagem percussiva no gênero. “A percussão não era muito valorizada (na época) e, através do meu conhecimento do folclore argentino, consegui adaptá-la muito bem ao xote, vanerão e outros ritmos”, explica. A audácia sofreu alguma resistência inicialmente mas, depois, tornou-se escola.

Nascido na cidade de Curuzú Cuatiá, nome guarani que significa cruz de papel, em 1º de outubro de 1952, Perez passou a interessar-se por música aos 3 anos, ao ouvir uma banda de rock da vizinhança, Los Estudiantes. “Empilhava tijolos para subir e poder vê-los pela janela”, recorda. Aos 7 anos, já em Paso de los Libres, ganhou um bombo leguero. Três anos mais tarde, integraria a bateria da escola de samba Zum Zum, na cidade fronteiriça, e, com 12 anos, passou a tocar em um cabaré. Procurando impor limites a Perez, a mãe o encaminhou para a banda do Exército argentino, aos 13.

Com a experiência musical adquirida, no final de 1982, Perez assinou um contrato como percussionista com a boate Gruta Azul, em Porto Alegre. No ano seguinte, começou a circular no meio nativista gaúcho. A primeira participação foi a convite do cantor Elton Saldanha. Depois se sucederam trabalhos para vários nomes conhecidos como Rui Biriva, Dante Ramon Ledesma e Daniel Torres. Traz ainda no currículo seis anos como integrante da banda de Renato Borghetti, uma parceria que iniciou em 1986, e gravações como o icônico tema “Os homens de preto”, do grupo Caverá. As performances e técnicas apuradas também abriram as portas para a atuação em festivais, shows e gravações. O baterista Matt Thofehrn, anfitrião do percussionista em Pelotas, salienta: “Perez foi um precursor da percuteria em festivais nativistas, usando efeitos sonoros, diversos bombos legueros afinados em escala e o primeiro a introduzir o uso de rototons na música regional. Ele definiu toda uma era em estética sonora e visual.” Thofehrn ainda enfatiza a performance e personalidade marcantes do músico. “Ele chamou rapidamente a atenção, graças a seu extremo respeito aos palcos, sempre aquecido como um verdadeiro atleta, e exigindo, o que na época era raro, passagem de som nas percussões dos festivais”, destaca.

Durante os anos 90, Perez transferiu-se para São Paulo. Na capital, deu aulas na escola do baterista Duda Neves, tendo, ao lado dele, acompanhado o síndico Tim Maia em cinco shows. Além de apresentações e gravações durante a temporada paulistana, desenvolveu, nas cidades de São Paulo e Presidente Prudente, trabalho de terapia musical através da percussão para pessoas especiais. Chegados os anos 2000, Perez mudou de ares novamente: um convite o levou para atuar como baterista em uma casa noturna especializada em música brasileira, a Maracanã, em Firenzi, na Itália. Teve as perspectivas profissionais ampliadas com a oportunidade para, como percussionista, acompanhar DJ’s em festas de música eletrônica. Paralelamente, retomou as atividades de terapia musical para pessoas especiais e ainda, em 2004, atendeu a um convite do produtor Dado Parisini, gravando quatro faixas do álbum Resta in ascolto, da cantora Laura Pausini.

Por mais de uma década afastado da América do Sul, a saudade determinou ao percussionista o momento de voltar. Retornou à Argentina, onde vive a filha Yenni, em 2016 e, no ano seguinte, ao Brasil, onde estão os filhos João Paulo e Ariel. Restabelecido em Porto Alegre, Perez encontrou uma realidade profissional diferente daquela que existia quando deixou o Estado. “Os contatos que eu tinha desapareceram como desapareceu a música gaúcha”, lamenta. Com o cenário da pandemia de Covid-19, os trabalhos tornaram-se mais escassos, mesmo para um profissional com seu currículo. Com um cartel de participação em mais de 1500 discos e cd’s, Perez vem, aos poucos, reconstruindo seu espaço no Rio Grande do Sul.  Leciona na Escola Casa da Música, na capital gaúcha, tem feito pequenas apresentações e encontra-se disponível para shows e gravações. Aposta também em um projeto de educação rítmica com indígenas Guarani, que deve ser retomado assim que a pandemia passar. Além disso, o músico se prepara para a produção de vídeoaulas e workshops.

Encontro inusitado – Os caminhos de Carlos Perez e Matt Thofehrn cruzaram-se primeiramente no mundo virtual.  Há pouco mais de um mês, o produtor musical Marcos Abreu postou em uma rede social o primeiro álbum gravado por Renato Borghetti. No mesmo post, Thofehrn interferiu. “Alguém sabe que fim teve o percussionista argentino que tocava neste disco?”, perguntou. Foi socorrido pelo acordeonista e pianista João Vicenti, que marcou Perez no comentário e disse que ele estava em Porto Alegre. Quase de imediato, Perez respondeu à mensagem e chamou Thofehrn para conversar em privado. Não demorou muito para que trocassem telefones. “Comecei a perguntar sobre experiências profissionais e gravações, e ele foi muito solícito. Em seguida falei: quero estudar contigo”, recorda. Finalmente, o encontro tornou-se realidade. Perez veio a Camaquã dar início a um projeto com o tecladista e arranjador Pablo Wolosky e, na sequência, desceu a Pelotas para encontrar o amigo recente. A afinidade entre ambos está sacramentada: mais encontros estão previstos e também a organização de um workshop sobre percussão.   

Por Daniel Silveira

Foto: Everton Maciel


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